A proposta de exercício de escrita criativa que foi apresentada aos alunos do 9º. 5 consistia em ligar duas partes de um dado texto. Apresentamos o melhor trabalho:
Entrei pela porta de um livro e
fechei-me lá dentro com as palavras acesas e as luzes apagadas. A minha mãe deu
voltas à casa à minha procura. “Onde é que o miúdo se terá metido?” Com medo de
ser encontrado, eu saltava das páginas pares para as ímpares e enrodilhava-me,
feito bicho-de-conta, entre dois parêntesis ou, por ser muito magro, atrás de
um ponto de exclamação. Era a primeira vez na minha vida que eu me fechava
dentro de um livro. (…)
O livro era agora o meu refúgio
e a minha casa, uma casa onde tudo era imprevisível e estranho e onde as letras
tinham espessura e cheiro como se fossem humanas. Confesso que me perdi lá
dentro …
Por
um lado, estava contente pois conseguira esconder-me da minha família, mas por
outro lado, estava com medo e precisava de um abraço da minha mãe, ou então
não, acho que o brilho daquelas palavras me confortava e me dizia: “não tenhas
medo, connosco estás seguro”.
Depois
as letras e as páginas começaram a fazer-me rir: sentava-me no traço horizontal
do A, fazia o (O) de baloiço, o E virava-se ao contrário e servia de banco e as
páginas serviam de escorrega, mas …
Joana, Sara,
Fábio, Tiago
Eu entrara inadvertidamente
naquele livro, mais pelo prazer da aventura do que pelo da leitura. Queria
fazer uma partida à família e aquela pareceu-me ser a forma mais engenhosa e
eficaz. Agora estava perdido dentro de um livro e não conseguia encontrar a
porta que me devolvesse ao pequeno mundo do exterior onde estavam os brinquedos,
os trabalhos de casa, os bichos-da-seda, os cromos do futebol e a minha
fantástica coleção de conchas.
José Jorge Letria, A mão esquerda de Cervantes
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