Leitura adiada há já algum tempo,
entranhou-se-me sem dificuldade, com muita curiosidade pelos detalhes das
narrativas e um especial prazer suscitado pela escrita muito rica, intensa,
envolvente de Fernando
Dacosta.
O autor explicita bem o seu propósito
no repto que lança na abertura: “Não apaguem a memória”, sublinhado no
encerramento: “ Retardar o esquecimento…” e, implicitamente, o próprio título
do livro, Os
Mal-Amados, remete para esse desiderato, dar voz a um conjunto de
figuras, cuja ação e/ou pensamento merecem um lugar ao sol no acantonamento da
historiografia portuguesa. Neste livro o autor revela e revela-se, através dos
retratos que nos apresenta, figuras centrais de um conjunto de fragmentos
organizados em 5 estações, os ciclos de vida de Portugal: Primavera, Verão,
Estio, Inverno e Outono.
Desde Salazar e Caetano, passando
por Cunhal, Soares, Amália, Natália Correia, Vergílio Ferreira, entre muitos
outros, terminando com o singular pensador Agostinho da Silva, Fernando Dacosta
percorre o séc. XX português, a partir do Estado Novo e até ao final do 1º
milénio, se atentarmos na data da 1ª edição da obra. Fá-lo com a segurança e a
sabedoria de quem viveu em diferentes regimes, conheceu e conviveu com pessoas
influentes, de diferentes quadrantes, desenvolvendo um sentimento de pertença,
melancolicamente crítica, que o identifica com esse grupo tão heterogéneo e ao
mesmo tempo tão unívoco, onde predominam, naturalmente, os escritores:
“Livro da minha disponibilidade interior
(erigida com persistência e desvelo), assenta num cordão de prata que,
inquebrável e quente, me liga aos idos para sempre.”
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